O empoderamento feminino no Brasil possui uma história rica e complexa que transcende a busca pela igualdade e abrange diversas dimensões. Compreender essa história é fundamental para valorizar as conquistas e reconhecer os desafios que ainda persistem.
Antes, vamos esclarecer alguns conceitos importantes, destacar também a importância da sororidade para o avanço do empoderamento feminino em nosso país:
Empoderamento Feminino: É o processo de conceder às mulheres o poder de controlar suas vidas, tomar decisões e influenciar a sociedade em que vivem. O empoderamento feminino não se limita à esfera individual, mas também envolve a transformação das estruturas sociais e políticas que perpetuam a desigualdade de gênero.
Sororidade: É a união e aliança entre mulheres, baseada na empatia e no companheirismo, para lutar por seus direitos e interesses. A sororidade é fundamental para fortalecer o movimento feminista e criar uma rede de apoio entre as mulheres, permitindo que elas superem os desafios e alcancem seus objetivos.
Raízes Históricas do Empoderamento Feminino no Brasil
Século XIX: Mulheres como Nísia Floresta, escritora e educadora, foram pioneiras na defesa da igualdade de gênero e do acesso à educação para as mulheres. Nísia Floresta Brasileira Augusta (1810-1885) é reconhecida por sua obra “Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens” (1832), um marco na defesa dos direitos femininos no Brasil. Além de seus escritos, Nísia Floresta fundou o Colégio Augusto, no Rio de Janeiro, em 1838, uma instituição inovadora que oferecia educação para meninas em áreas como ciências, artes e literatura, desafiando os padrões educacionais da época que limitavam a educação feminina a habilidades domésticas.
Início do Século XX: O movimento sufragista ganhou força, com mulheres como Bertha Lutz liderando a luta pelo direito ao voto, conquistado em 1932. Bertha Lutz (1894-1976) foi uma bióloga, advogada e diplomata que liderou a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, uma organização chave na campanha pelo voto feminino. A atuação de Bertha Lutz não se limitou ao Brasil; ela também representou o país em conferências internacionais, como a Conferência da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1919, onde defendeu a igualdade salarial entre homens e mulheres.
Ditadura Militar: Apesar da repressão, mulheres se organizaram em movimentos de resistência e em defesa dos direitos humanos. A participação de mulheres em movimentos como o Movimento Feminino pela Anistia (MFPA) demonstra a resiliência e a determinação das mulheres em lutar por seus direitos em tempos difíceis. O MFPA, criado em 1975, foi um movimento fundamental na luta pela anistia dos presos políticos e exilados durante a ditadura militar. Mulheres como Therezinha Zerbini e Carmen da Silva tornaram-se figuras proeminentes na defesa dos direitos humanos e na denúncia da tortura e da violência praticadas pelo regime militar.
Redemocratização: A Constituição de 1988 representou um marco, garantindo a igualdade de direitos entre homens e mulheres. No entanto, a implementação efetiva desses direitos ainda enfrenta desafios, como a persistência da desigualdade salarial e a sub-representação política. A Constituição de 1988, em seu artigo 5º, estabelece que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”. Apesar desse avanço legal, a realidade demonstra que a igualdade de gênero ainda não foi plenamente alcançada, com disparidades salariais, violência de gênero e sub-representação política persistindo como desafios a serem superados.
Dimensões Atuais: Avanços e Desafios
Empoderamento Econômico
Participação no Mercado de Trabalho: A inserção das mulheres no mercado de trabalho tem aumentado ao longo das décadas, mas ainda enfrenta obstáculos como a desigualdade salarial, a discriminação de gênero e a falta de oportunidades em cargos de liderança. Dados de 2025 indicam que as mulheres brasileiras ganham, em média, 20% menos que os homens, mesmo exercendo funções semelhantes. Essa diferença salarial, conhecida como gender pay gap, é um reflexo da desvalorização do trabalho feminino e da persistência de estereótipos de gênero. Além disso, as mulheres são frequentemente relegadas a ocupações com menor remuneração e menor prestígio social.
Empreendedorismo Feminino: O empreendedorismo feminino tem se destacado como uma importante via de empoderamento econômico. Muitas mulheres têm criado seus próprios negócios, gerando renda e promovendo o desenvolvimento local. Setores como moda, beleza, alimentação e serviços são áreas onde o empreendedorismo feminino tem se mostrado particularmente forte. Programas de apoio às mulheres, como linhas de crédito e capacitação oferecidas pelo SEBRAE e outras instituições, têm contribuído para fortalecer essa tendência. Um exemplo é o programa “Mulheres no Topo” do Banco do Brasil, que oferece condições especiais de crédito e capacitação para mulheres que desejam iniciar ou expandir seus negócios.
Sobrecarga de Trabalho: A dupla jornada de trabalho (cuidado com a casa e os filhos) e a falta de acesso a recursos financeiros e redes de apoio são alguns dos principais desafios enfrentados pelas empreendedoras brasileiras. A dificuldade em conciliar as responsabilidades familiares com a gestão de um negócio pode limitar o crescimento e o sucesso das empresas lideradas por mulheres. Além disso, o acesso a crédito e a investimentos ainda é mais difícil para as mulheres, que muitas vezes enfrentam preconceito e desconfiança por parte dos investidores. A criação de redes de apoio e mentoria, bem como políticas públicas que facilitem o acesso a crédito e a serviços de cuidado infantil, são fundamentais para superar esses desafios.
Empoderamento Social
Educação: No Brasil, as mulheres têm superado os homens em escolaridade, com maior número de matrículas no ensino superior e maior taxa de conclusão de cursos. No entanto, essa vantagem nem sempre se traduz em melhores oportunidades no mercado de trabalho. A escolha de cursos tradicionalmente considerados “femininos”, como pedagogia e enfermagem, em detrimento de áreas como engenharia e tecnologia, pode limitar as opções de carreira e a remuneração das mulheres. É importante incentivar a participação feminina em todas as áreas do conhecimento e combater os estereótipos de gênero que influenciam as escolhas educacionais.
Saúde: O acesso a serviços de saúde de qualidade, como planejamento familiar, pré-natal e prevenção de doenças, é fundamental para garantir a autonomia e o bem-estar das mulheres. A saúde sexual e reprodutiva, em particular, é um direito fundamental que deve ser garantido a todas as mulheres, independentemente de sua condição social ou econômica. A implementação de políticas públicas que promovam a saúde da mulher, como a ampliação do acesso a métodos contraceptivos e a programas de prevenção do câncer de mama e do colo do útero, é essencial para garantir o empoderamento social das mulheres.
Combate à Violência de Gênero: A violência contra a mulher é um grave problema social que afeta milhões de brasileiras. A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e a Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104/2015) representaram um avanço importante no combate à violência doméstica e contra a mulher, ao criar mecanismos de proteção e punição para os agressores. O programa “Casa da Mulher Brasileira”, por exemplo, oferece um atendimento integrado às mulheres em situação de violência, reunindo em um só lugar serviços como delegacia, defensoria pública, juizado e assistência social. No entanto, a violência contra a mulher ainda é um problema persistente, é fundamental fortalecer a rede de proteção às vítimas, ampliar o acesso à justiça e promover campanhas de conscientização para combater a cultura do machismo e da violência.
Empoderamento Político
Participação na Política: A participação das mulheres na política brasileira ainda é baixa, apesar dos avanços nas últimas décadas. A Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97), que estabelece um percentual mínimo de candidaturas femininas, contribuiu para aumentar a representação das mulheres no legislativo, mas ainda é preciso superar barreiras culturais e estruturais para garantir a igualdade de gênero na política. A resistência dos partidos políticos em investir em candidaturas femininas, a falta de apoio financeiro e a discriminação de gênero são alguns dos obstáculos que as mulheres enfrentam para entrar e permanecer na política.
Cargos de Liderança: A presença de mulheres em cargos de liderança no governo, nas empresas e em outras instituições ainda é limitada. A falta de modelos femininos e a discriminação de gênero são alguns dos fatores que dificultam o acesso das mulheres a posições de poder. A implementação de políticas de ação afirmativa, como a reserva de vagas para mulheres em cargos de liderança, e a promoção de programas de mentoria e capacitação para mulheres podem contribuir para aumentar a representação feminina em posições de poder.
7 Princípios de Empoderamento das Mulheres
Para concluir, confira os 7 Princípios de Empoderamento das Mulheres desenvolvido pela ONU Mulheres que são um guia para empresas e organizações que desejam promover a igualdade de gênero e o empoderamento feminino:
1. Estabelecer liderança corporativa de alto nível para a igualdade de gênero. Este princípio enfatiza a importância do compromisso da alta administração com a igualdade de gênero, demonstrando que a empresa valoriza a diversidade e a inclusão.
2. Tratar todos os homens e mulheres de forma justa no trabalho, respeitando e apoiando os direitos humanos e a não discriminação. Este princípio garante que todos os funcionários sejam tratados com respeito e dignidade, independentemente de seu gênero, e que a empresa adote políticas e práticas que promovam a igualdade de oportunidades.
3. Garantir a saúde, segurança e bem-estar de todos os trabalhadores e trabalhadoras. Este princípio reconhece a importância de criar um ambiente de trabalho seguro e saudável para todos os funcionários, incluindo a implementação de políticas de prevenção e combate ao assédio sexual e moral.
4. Promover a educação, treinamento e desenvolvimento profissional das mulheres. Este princípio incentiva as empresas a investirem no desenvolvimento profissional de suas funcionárias, oferecendo oportunidades de treinamento, mentoria e progressão na carreira.
5. Implementar práticas de desenvolvimento empresarial, cadeia de suprimentos e marketing que empoderem as mulheres. Este princípio incentiva as empresas a adotarem práticas que promovam o empoderamento feminino em toda a sua cadeia de valor, desde a seleção de fornecedores até a criação de campanhas de marketing.
6. Promover a igualdade através de iniciativas comunitárias e defesa de direitos. Este princípio incentiva as empresas a se envolverem em iniciativas comunitárias que promovam a igualdade de gênero e o empoderamento feminino, como o apoio a organizações que trabalham com mulheres em situação de vulnerabilidade.
7. Medir e divulgar o progresso para alcançar a igualdade de gênero. Este princípio enfatiza a importância de monitorar e avaliar o progresso da empresa em relação à igualdade de gênero, divulgando os resultados para stakeholders e utilizando-os para identificar áreas de melhoria.